Trazemos para o Blog SOS Interativo, um relato de
experiência muito produtiva e que aponta horizontes promissores. Como parte do
estágio de pós-doutoramento, no segundo semestre letivo de 2011 assumi a turma
B da disciplina “Introdução ao Jornalismo” na Faculdade de Comunicação da
Universidade de Brasília, sob a supervisão da professora doutora Dione Moura.
Pelo fato de ser uma cadeira que dispensa pré-requisito, além dos estudantes
regularmente matriculados no curso de Jornalismo, que compõem a Turma A,
recebemos estudantes de outros cursos, em atendimento ao regime
didático-científico da instituição que, em seu artigo 89, determina que “o
aluno de curso regular de graduação compõe o seu programa de estudos com
disciplinas do Módulo Integrante e do Módulo Livre”, e o parágrafo 3º define:
“As disciplinas do Módulo Livre são de livre escolha do aluno entre as
disciplinas oferecidas pela Universidade e correspondem a 24 (vinte e quatro)
créditos, pelo menos, para os cursos regulares de duração plena.” No presente
artigo, pretendemos destacar também a inclusão da interface mídia-educação
(BELLONI, 2005) no processo de ensino-aprendizagem, em diálogo com outras
experiências que aliam mídia, educação e cidadania no contexto da Faculdade de
Comunicação da UnB (MOURA et. alli.,2011).
Dos 31 alunos matriculados
na Turma B (60 horas) apenas dois estavam matriculados em Jornalismo. Das
outras áreas de Comunicação, eram dois de Publicidade e Propaganda, um de
Audiovisual, cinco de Comunicação Organizacional e os demais oriundos dos
cursos de Odontologia, Psicologia, Ciências Contábeis, Biblioteconomia,
Filosofia, Letras, História, Pedagogia, Nutrição e Ciências da Computação.
Tal diversidade provocou o
primeiro questionamento: por que escolheram o jornalismo, dentre os demais
cursos oferecidos na UnB, para o cumprimento de créditos do módulo livre? As
respostas surgiram já no primeiro contato, no momento das apresentações, e
foram as mais variadas e inusitadas, como: 1) interesse por games e cultura
pop, 2) escolha do jornalismo como primeira opção (sem ter alcançado índice no
vestibular), 3) interesse pelas técnicas profissionais, a proximidade física da
FAC com o local das duas aulas posteriores, 4) convite do colega que não queria
frequentar sozinho, 5) falta de alternativa em outras cadeiras em função do
horário disponível no curso de origem, 6) opção pelas disciplinas introdutórias
no cumprimento dos créditos de módulo livre, 6) estar cursando jornalismo em
outra instituição privada, 7) experiência anterior em rádio e construção de
site e 8) interesse por fotografia.
Diante da realidade
apresentada, consideramos adequado promover algumas alterações ao plano de
ensino, respeitando a ementa, haja vista que com exceção de apenas dois, os
demais alunos não dariam sequência aos estudos de jornalismo. Sob orientação da
professora Dione Moura, optamos por reduzir a carga de informações quanto às
técnicas de elaboração do texto noticioso, especialmente do jornalismo
impresso, que serviria como iniciação às demais disciplinas práticas oferecidas
ao longo do curso de graduação, e cumprir o objetivo de apresentar um programa
que contemple os fundamentos básicos da teoria e da prática do jornalismo;
pensar a notícia e sua produção; compreender a dimensão do trabalho do
jornalista, a relação com as fontes e os princípios éticos da profissão.
Como eles iriam se
encontrar apenas uma vez por semana optamos também por criar um grupo fechado
no Facebook (a rede social mais comum a todos) denominada “IJOR-B”, na qual
trocamos informações sobre o andamento da disciplina, passamos informes,
sugerimos leituras, vídeos e eventos acadêmicos e culturais complementares.
Mesmo após a conclusão da disciplina, o grupo se mantém ativo, embora com menor
grau de interação, e por meio dele ainda compartilhamos informações sobre
jornalismo.
Teoria
e prática
O desafio proposto aos alunos foi a
realização da atividade prática: entrevistas em vídeo, ficando a turma
responsável pela pauta, produção, entrevista, gravação e edição. Mesmo cientes
de que as experiências em produção audiovisual normalmente se dão na segunda
metade do curso, quando os alunos já passaram pelas experiências em jornalismo
impresso, online, rádio e, no caso específico da FAC, pela disciplina
obrigatória de “Oficinas Básicas de Audiovisual”, foram três os motivos que nos
levaram a essa opção: 1) ser a televisão o veículo de maior acesso ao
noticiário (informação detectada durante o primeiro encontro); 2) a
auto-avaliação do desempenho e a seleção das informações colhidas seriam mais
facilmente compreendidas ao assistirem a entrevista realizada e 3) por fazer
parte da atividade docente do estágio de pós-doutoramento, todos cumpririam uma
etapa fundamental da produção da informação – a veiculação, já que estavam
cientes de que os trabalhos seriam exibidos na UnBClick WebTV (www.youtube.com/unbclick),
laboratório experimental de webtv (MOURA & RAMALHO, 2012).
Resultados
e avaliação
A turma
foi dividida em cinco grupos, e as pautas por eles sugeridas foram:
“Cobertura do evento 100 anos McLuhan”, “Segurança no Campus da UnB”, “Pesquisa
sobre entomologia forense”, “Grupo de música gospel Trio & K” e “Empresa
Júnior do curso de Nutrição”. As gravações foram realizadas no estúdio de TV da
FAC e na sala de aula, em três encontros; e o processo de edição em outros
três. Nessas etapas, todos receberam instruções de técnicos do Laboratório
Audiovisual da FAC, mas os alunos ficaram responsáveis pelas funções de
pauteiro/produtor, cinegrafista, entrevistador e editor de imagens.
No 18º e último encontro, recebemos artigos
referentes ao conteúdo sobre ética profissional, que compuseram a nota das
demais atividades práticas; assistimos e avaliamos os resultados da atividade
prática e aplicamos um questionário de avaliação da disciplina e auto-avaliação
(com retorno facultativo, sem composição na menção final). Dos 31 matriculados,
obtivemos retorno de 17 estudantes (54,8%), sendo cinco de Comunicação
Organizacional, quatro de Nutrição, dois de Biblioteconomia e um de Computação,
Psicologia, Audiovisual, Ciências Contábeis, Jornalismo e Letras.
Sobre o aprendizado construído na disciplina,
a maioria apontou a importância que deram à valorização da profissão e do
profissional de jornalismo, o conceito de valor-notícia, a complexidade das
etapas de produção e apuração das informações, a compreensão dos conceitos e
técnicas e a importância de uma leitura crítica da mídia.
Quanto às dificuldades, a atividade prática
demonstrou ter sido o maior desafio, especialmente na operação da
câmera/iluminação e no software de edição não-linear, embora os alunos tenham
salientado positivamente o apoio recebido dos técnicos nas explicações que se
fizeram necessárias.
Procuramos saber, ainda, qual a
contribuição da experiência para suas futuras profissões. A atuação
interdisciplinar, as condições teóricas para uma compreensão sobre a produção
da notícia e, considerando que poderão cumprir o papel de fontes de informação,
o interesse jornalístico e a conceituação de “notícia”.
No item “metodologia da disciplina”, a
maioria respondeu que embora tenha se deparado com dificuldades técnicas
inerentes à produção audiovisual, aprovou o desafio e alguns sugeriram
inclusive outras atividades práticas, em diferentes suportes.s.
Finalmente,
solicitamos uma auto-avaliação quanto à dedicação nas aulas (“ótimo”,” bom”,
“regular” e “insuficiente”, nos itens “leitura dos textos indicados”, “troca de
experiências com colegas e professora”, “realização das atividades propostas”,
“interesse pelas atividades da disciplina” e “pontuação na entrega dos
trabalhos), além de uma nota (zero a 10).
Os quesitos “ótimo e bom” prevaleceram em mais de 90%. A auto-avaliação trouxe oito notas 10, oito
notas 9 e uma nota 7. Os quesitos com menor grau na auto-avaliação foi no
envolvimento com a leitura prévia dos textos de apoio.
Embora
possa parecer um resultado superdimensionado, da parte dos alunos, entendi
estar de acordo com minha própria avaliação da aprendizagem, pois, dadas as
diferenças de interesses profissionais, a participação nas discussões foram
extremamente positivas, confirmando a premissa de que o jornalismo, enquanto área
de conhecimento no campo das ciências sociais aplicadas, tem caráter
multidisciplinar e pode – e porque não deveria? – estar presente na formação de
quaisquer profissionais, dada sua importância no cotidiano e na prática social.
Outro aspecto que consideramos basilar,
lançando um olhar sobre esta experiência de ensino-aprendizagem, foi a inclusão
deliberada da produção audiovisual como um alicerce para a dinâmica da
disciplina. Como proposto por Laura Coutinho (BRASIL, 2005), concordamos que a
produção audiovisual deve ser percebida para além das câmeras. Desta forma,
inserimos uma interface mídia/educação na disciplina, incluindo uma mídia
digital (webtv) no contexto da educação formal.
Enquanto
experiência docente, nos 12 anos de atuação no ensino de jornalismo este foi,
sem dúvida, um dos grandes desafios, pela diversidade de formação e de
interesses não apenas pelos temas propostos, como também pela solução
metodológica que atendesse às expectativas e cumprisse com os objetivos
institucionais da oferta de uma formação acadêmica transdisciplinar, que é uma
das marcas da Universidade de Brasília.
Referências
BELLONI, Maria Luiza. O que é mídia-educação. Campinas:
Autores Associados, 2a edição, 2005.
MOURA, Dione O. (Coord.). Comunicação e Cidadania: princípios e
processos. Brasília: Francis, 2011.
MOURA, Dione O.; RAMALHO,
Alzimar. Pesquisa Webtv: Mudanças no
ensino de Comunicação em um cenário de protagonismo e convergência. Itajaí (SC): Vozes e Diálogo, junho 2012 (no prelo).
Alzimar Ramalho (alzimar@usp.br) é jornalista, doutora em Ciências da Comunicação pela ECA/USP (2010), pós-doutora pela Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília (2012). Docente nas faculdades IESB e Facitec (Brasília-DF). Essa experiência foi relatada no 14º Encontro Nacional de Professores de Jornalismo (Uberlândia-MG, em abril de 2012).
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