20 de jun. de 2012

Experiência em produção audiovisual, mídia e educação na FAC/UnB: jornalismo e formação multidisciplina

Por Alzimar Ramalho

Trazemos para o Blog SOS Interativo, um relato de experiência muito produtiva e que aponta horizontes promissores. Como parte do estágio de pós-doutoramento, no segundo semestre letivo de 2011 assumi a turma B da disciplina “Introdução ao Jornalismo” na Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília, sob a supervisão da professora doutora Dione Moura. Pelo fato de ser uma cadeira que dispensa pré-requisito, além dos estudantes regularmente matriculados no curso de Jornalismo, que compõem a Turma A, recebemos estudantes de outros cursos, em atendimento ao regime didático-científico da instituição que, em seu artigo 89, determina que “o aluno de curso regular de graduação compõe o seu programa de estudos com disciplinas do Módulo Integrante e do Módulo Livre”, e o parágrafo 3º define: “As disciplinas do Módulo Livre são de livre escolha do aluno entre as disciplinas oferecidas pela Universidade e correspondem a 24 (vinte e quatro) créditos, pelo menos, para os cursos regulares de duração plena.” No presente artigo, pretendemos destacar também a inclusão da interface mídia-educação (BELLONI, 2005) no processo de ensino-aprendizagem, em diálogo com outras experiências que aliam mídia, educação e cidadania no contexto da Faculdade de Comunicação da UnB (MOURA et. alli.,2011).

Dos 31 alunos matriculados na Turma B (60 horas) apenas dois estavam matriculados em Jornalismo. Das outras áreas de Comunicação, eram dois de Publicidade e Propaganda, um de Audiovisual, cinco de Comunicação Organizacional e os demais oriundos dos cursos de Odontologia, Psicologia, Ciências Contábeis, Biblioteconomia, Filosofia, Letras, História, Pedagogia, Nutrição e Ciências da Computação.

Tal diversidade provocou o primeiro questionamento: por que escolheram o jornalismo, dentre os demais cursos oferecidos na UnB, para o cumprimento de créditos do módulo livre? As respostas surgiram já no primeiro contato, no momento das apresentações, e foram as mais variadas e inusitadas, como: 1) interesse por games e cultura pop, 2) escolha do jornalismo como primeira opção (sem ter alcançado índice no vestibular), 3) interesse pelas técnicas profissionais, a proximidade física da FAC com o local das duas aulas posteriores, 4) convite do colega que não queria frequentar sozinho, 5) falta de alternativa em outras cadeiras em função do horário disponível no curso de origem, 6) opção pelas disciplinas introdutórias no cumprimento dos créditos de módulo livre, 6) estar cursando jornalismo em outra instituição privada, 7) experiência anterior em rádio e construção de site e 8) interesse por fotografia.

Diante da realidade apresentada, consideramos adequado promover algumas alterações ao plano de ensino, respeitando a ementa, haja vista que com exceção de apenas dois, os demais alunos não dariam sequência aos estudos de jornalismo. Sob orientação da professora Dione Moura, optamos por reduzir a carga de informações quanto às técnicas de elaboração do texto noticioso, especialmente do jornalismo impresso, que serviria como iniciação às demais disciplinas práticas oferecidas ao longo do curso de graduação, e cumprir o objetivo de apresentar um programa que contemple os fundamentos básicos da teoria e da prática do jornalismo; pensar a notícia e sua produção; compreender a dimensão do trabalho do jornalista, a relação com as fontes e os princípios éticos da profissão.

Como eles iriam se encontrar apenas uma vez por semana optamos também por criar um grupo fechado no Facebook (a rede social mais comum a todos) denominada “IJOR-B”, na qual trocamos informações sobre o andamento da disciplina, passamos informes, sugerimos leituras, vídeos e eventos acadêmicos e culturais complementares. Mesmo após a conclusão da disciplina, o grupo se mantém ativo, embora com menor grau de interação, e por meio dele ainda compartilhamos informações sobre jornalismo.

Teoria e prática
O desafio proposto aos alunos foi a realização da atividade prática: entrevistas em vídeo, ficando a turma responsável pela pauta, produção, entrevista, gravação e edição. Mesmo cientes de que as experiências em produção audiovisual normalmente se dão na segunda metade do curso, quando os alunos já passaram pelas experiências em jornalismo impresso, online, rádio e, no caso específico da FAC, pela disciplina obrigatória de “Oficinas Básicas de Audiovisual”, foram três os motivos que nos levaram a essa opção: 1) ser a televisão o veículo de maior acesso ao noticiário (informação detectada durante o primeiro encontro); 2) a auto-avaliação do desempenho e a seleção das informações colhidas seriam mais facilmente compreendidas ao assistirem a entrevista realizada e 3) por fazer parte da atividade docente do estágio de pós-doutoramento, todos cumpririam uma etapa fundamental da produção da informação – a veiculação, já que estavam cientes de que os trabalhos seriam exibidos na UnBClick WebTV (www.youtube.com/unbclick), laboratório experimental de webtv (MOURA & RAMALHO, 2012).

Resultados e avaliação
A turma  foi dividida em cinco grupos, e as pautas por eles sugeridas foram: “Cobertura do evento 100 anos McLuhan”, “Segurança no Campus da UnB”, “Pesquisa sobre entomologia forense”, “Grupo de música gospel Trio & K” e “Empresa Júnior do curso de Nutrição”. As gravações foram realizadas no estúdio de TV da FAC e na sala de aula, em três encontros; e o processo de edição em outros três. Nessas etapas, todos receberam instruções de técnicos do Laboratório Audiovisual da FAC, mas os alunos ficaram responsáveis pelas funções de pauteiro/produtor, cinegrafista, entrevistador e editor de imagens.

No 18º e último encontro, recebemos artigos referentes ao conteúdo sobre ética profissional, que compuseram a nota das demais atividades práticas; assistimos e avaliamos os resultados da atividade prática e aplicamos um questionário de avaliação da disciplina e auto-avaliação (com retorno facultativo, sem composição na menção final). Dos 31 matriculados, obtivemos retorno de 17 estudantes (54,8%), sendo cinco de Comunicação Organizacional, quatro de Nutrição, dois de Biblioteconomia e um de Computação, Psicologia, Audiovisual, Ciências Contábeis, Jornalismo e Letras.

Sobre o aprendizado construído na disciplina, a maioria apontou a importância que deram à valorização da profissão e do profissional de jornalismo, o conceito de valor-notícia, a complexidade das etapas de produção e apuração das informações, a compreensão dos conceitos e técnicas e a importância de uma leitura crítica da mídia.

Quanto às dificuldades, a atividade prática demonstrou ter sido o maior desafio, especialmente na operação da câmera/iluminação e no software de edição não-linear, embora os alunos tenham salientado positivamente o apoio recebido dos técnicos nas explicações que se fizeram necessárias.

Procuramos saber, ainda, qual a contribuição da experiência para suas futuras profissões. A atuação interdisciplinar, as condições teóricas para uma compreensão sobre a produção da notícia e, considerando que poderão cumprir o papel de fontes de informação, o interesse jornalístico e a conceituação de “notícia”.

No item “metodologia da disciplina”, a maioria respondeu que embora tenha se deparado com dificuldades técnicas inerentes à produção audiovisual, aprovou o desafio e alguns sugeriram inclusive outras atividades práticas, em diferentes suportes.s.

Finalmente, solicitamos uma auto-avaliação quanto à dedicação nas aulas (“ótimo”,” bom”, “regular” e “insuficiente”, nos itens “leitura dos textos indicados”, “troca de experiências com colegas e professora”, “realização das atividades propostas”, “interesse pelas atividades da disciplina” e “pontuação na entrega dos trabalhos), além de uma nota (zero a 10).  Os quesitos “ótimo e bom” prevaleceram em mais de 90%.  A auto-avaliação trouxe oito notas 10, oito notas 9 e uma nota 7. Os quesitos com menor grau na auto-avaliação foi no envolvimento com a leitura prévia dos textos de apoio.

Embora possa parecer um resultado superdimensionado, da parte dos alunos, entendi estar de acordo com minha própria avaliação da aprendizagem, pois, dadas as diferenças de interesses profissionais, a participação nas discussões foram extremamente positivas, confirmando a premissa de que o jornalismo, enquanto área de conhecimento no campo das ciências sociais aplicadas, tem caráter multidisciplinar e pode – e porque não deveria? – estar presente na formação de quaisquer profissionais, dada sua importância no cotidiano e na prática social.

Outro aspecto que consideramos basilar, lançando um olhar sobre esta experiência de ensino-aprendizagem, foi a inclusão deliberada da produção audiovisual como um alicerce para a dinâmica da disciplina. Como proposto por Laura Coutinho (BRASIL, 2005), concordamos que a produção audiovisual deve ser percebida para além das câmeras. Desta forma, inserimos uma interface mídia/educação na disciplina, incluindo uma mídia digital (webtv) no contexto da educação formal.

Enquanto experiência docente, nos 12 anos de atuação no ensino de jornalismo este foi, sem dúvida, um dos grandes desafios, pela diversidade de formação e de interesses não apenas pelos temas propostos, como também pela solução metodológica que atendesse às expectativas e cumprisse com os objetivos institucionais da oferta de uma formação acadêmica transdisciplinar, que é uma das marcas da Universidade de Brasília.


Referências
BELLONI, Maria Luiza. O que é mídia-educação. Campinas: Autores Associados, 2a edição, 2005.
BRASIL.SEED-MEC. Integração das Tecnologias na Educação. COUTINHO, Laura Maria. Aprender com o vídeo: Para além das câmeras, as ideias. Brasília, Ministério da Educação, SEED, 2005.
MOURA, Dione O. (Coord.). Comunicação e Cidadania: princípios e processos. Brasília: Francis, 2011.
MOURA, Dione O.; RAMALHO, Alzimar. Pesquisa Webtv: Mudanças no ensino de Comunicação em um cenário de protagonismo e convergência. Itajaí (SC): Vozes e Diálogo, junho 2012 (no prelo).



Alzimar Ramalho (alzimar@usp.br) é jornalista, doutora em Ciências da Comunicação pela ECA/USP (2010), pós-doutora pela Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília (2012). Docente nas faculdades IESB e Facitec (Brasília-DF). Essa experiência foi relatada no 14º Encontro Nacional de Professores de Jornalismo (Uberlândia-MG, em abril de 2012).

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