Amy Winehouse, uma vítima do seu tempo e de suas redes
“Os médicos disseram que era impossível, mas ela conseguiu. Ela estava se empenhando muito em lidar com o alcoolismo e tinha acabado de completar três semanas de abstinência” – Mich Winehouse, pai de Amy, em entrevista à revista Rolling Stone.
A maioria dos tabloides, sites e veículos de comunicação noticiaram, no dia 23 de julho, a morte de Amy Winehouse como sendo por overdose. Os meios de comunicação julgaram o ocorrido com certa convicção. Porém, em uma primeira análise da pericia, não foi possível saber a causa da morte.
No turbilhão de informações – muitas perdidas e outras tantas equivocadas -, a opinião pública não precisou esperar pelo laudo oficial, o histórico da cantora era suficiente – e bem tentador – para embasar os pré-julgamentos. E assim foi. A causa de overdose virou uma verdadeira overdose não só nos noticiários, mas também nas redes sociais. Críticas, piadas de mau gosto e o juízo de valor equivocadamente antecipado sobre o caso demonstraram a grande falta de respeito com a cantora.
Os pais de Amy estavam cientes de que a filha não estava ingerindo álcool e drogas. Eles acreditam que ela tenha morrido de abstinência. Motivo este que, a TV, jornais, revistas e redes sociais ignoraram dos próprios pais de Amy.
No dia 24 de agosto de 2011, o resultado parcial da perícia de Amy informou que ainda não tinha conseguido identificar o real motivo da morte, mas deixou claro que não foram encontrados nenhum vestígio de álcool ou drogas.
Espera-se um relatório final da perícia londrina até a primeira quinzena do próximo mês.
Amy Winehouse foi mais uma vítima de uma geração pós-moderna, que na frente das câmeras e flashes mostrou ser o que qualquer um é: humano.
Oito anos, uma estrela
"Quando ela cantava, era como se saísse de seu diário. Soava muito simples, mas ela conseguia estabelecer uma conexão. Ela era uma verdade ambulante." - Zalon Thompson, vocalista de apoio de Amy, à Rolling Stone.
Amy Winehouse, que sofreu influência musical de Frank Sinatra e Dinah Washington, cantou profissionalmente somente por oito anos, gravou dois discos, faturou cinco Grammy e viveu uma carreira cheia de deslizes.
Aos 15 anos começou a fumar maconha, largou os estudos e, aos 16, montou sua primeira banda de jazz, apresentando-se em bares londrinos. Assim, engatou aos 19 anos com seu primeiro disco notável, Frank.
Com Back to Black (2007,) Winehouse chegou ao topo das paradas de sucesso e também ao auge do declínio com drogas, bebidas e relacionamentos. Em 2008, ela se internou para tratar de seus problemas, deixando de lado as drogas. De acordo com o Código Internacional de Doenças, dependência química nada tem a ver com falta de caráter ou vergonha. Tem a ver com a ignorância, não do dependente e sim daqueles que não compreendem e julgam. Amy tentou se libertar delas.
Em 2009, viajou para a ilha caribenha de Santa Lúcia, onde ficou alguns meses, recuperou a forma e se encheu de vida novamente. Conseguiu se livrar das drogas pesadas e criou laços fortes com moradores caribenhos, onde até pensou em adotar uma menina de 10 anos que mora na ilha.
Um caso especial foi Marjorie Lambert, dona de um bar na cidade em que Winehouse conseguiu ter espaço e abertura como nunca antes. “Era amiga de todos e amava as crianças. Ela ficava por aí exatamente como a gente, sentada, comendo junto, rindo junto, contando piadas, sabe?”, relatou, também para a Rolling Stone.
Para tantas conquistas ainda por vir Amy esperava se recuperar de vez. Estava empenhada para isso. Já tinha letras escritas para o novo disco, entretando, estas também esperavam a recuperação total de Amy.
Há pouco mais de um mês a diva do Soul partiu deste mundo, mas deixou como legado registros em seus discos com uma voz surpreendente, inabalável e inesquecível, voz tal que ressuscitou o jazz contemporâneo.
Tão incisivos os adjetivos, pois Amy Winehouse passou de uma vida cotidiana para as paradas de sucesso por seu talento inestimável, dando de brinde à mídia inúmeros escândalos estampados nos tabloides de todo mundo.
2 interações:
Excelente texto. O pré-julgamento não é exclusividade da mídia, mas quando à luz de seus holofotes ganha uma dimensão monstruosa e causa danos irreparáveis. A voz de Amy era sensacional e é por esse motivo que ela deveria ser lembrada. Frente às câmeras ou nos bastidores, quando não estava cantando, Amy era uma pessoa como qualquer outra, suscetível. É triste quando as pessoas resolvem ignorar esse fato.
Se a sociedade - e a mídia tem um importante papel nisso - começasse a encarar o problema da dependência química como uma doença, o que de fato é, e não como "safadeza" ou "falta de vergonha na cara", talvez Amy não tivesse sofrido um terço da exposição e ridicularização a que foi submetida. Expõem, sem dó nem piedade, o sofrimento e a vulnerabilidade alheia - e o pior: com o nosso consentimento. Triste. Para a mídia. Para a sociedade. E para nós, futuros formadores de opinião.
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