A primeira pauta da discussão foi exatamente definir sobre o quê discutiríamos. Jornalismo barato é aquele destinado a um público de menor renda? Ou seria um jornalismo de ‘pior qualidade’? Mas o que seria essa ‘qualidade’? Os próprios ‘grandes jornais’ compram matérias prontas das Grandes Agências Internacionais. E os jornais destinados a um público de menor renda já venceram o ‘Prêmio Esso de Melhor Reportagem’ várias vezes. O que seria, afinal, esse tipo de Jornalismo?
Depois de várias discussões, decidimos fazer o programa sobre Jornalismo Popular. Sim, ele é destinado às classes mais baixas, e isso implica, necessariamente (veremos o porquê), numa mudança de linguagem e numa mudança no preço (daí a nossa referência a um jornalismo ‘barato’, no início da discussão). Mas esse tipo de jornal é de ‘pior qualidade’? É esse o ponto.
Vamos começar definindo exatamente o que seria esse Jornal Popular. Em primeiro lugar, vamos delimitar nossa conversa aos Jornais Impressos. A televisão aberta e o rádio, por definição, são meios de comunicação para um grande público, mas são gratuitos. Em seguida, vamos descartar os Jornais Comunitários. É uma comunicação interna de um determinado grupo, não há como estudar cada caso nem generalizar – diferente do que acontece nos jornais comerciais. E é exatamente onde chegamos.
A partir da metade da década de 1990, grandes empresas de comunicação vêm lançando jornais destinados a leitores populares. E como explica Márcia Amaral: ‘As publicações destinadas às classes B, C e D integram um novo mercado a ser analisado, caracterizado por um público que não quer apenas histórias incríveis e inverossímeis, mas compra jornais em busca também de prestação de serviço e entretenimento. São jornais que atendem às regiões metropolitanas, apostam nas editorias de Cidades e não têm a pretensão de se tornarem nacionais’ (Imprensa popular: sinônimo de jornalismo popular?). É essa a definição de que precisávamos.
O caso do Aqui DF é perfeito. Quando foi lançado, no início de 2006, 25% dos leitores eram das classes A e B. O jornal estava concorrendo com o próprio Correio Braziliense, do mesmo grupo, e não era esse o objetivo. Foi realizada uma reformulação na linguagem e na organização das editorias, e a partir disso o jornal começou a ser mais vendido para leitores mais populares. É por isso que, no começo da conversa, chegamos a conclusão de que esse tipo de jornalismo necessariamente tem uma linguagem diferente. Se não for assim, os jornais pequenos concorrem com os grandes, e isso não dá lucro.
E essa é a maior característica desse tipo de jornalismo. Digamos que, por exemplo, o governo tenha aumentado a taxação de bebidas alcoólicas. Nada de manchetes como ‘Banco Central, pressionado por tal e tal partido, e depois de manifestações da ong tal, aumentou a taxação de bebidas alcoólicas’. A ação em si (o aumento nas taxas) quase não aparece na notícia. No jornal popular, a manchete vai ser algo como: ‘Cervejinha vai ficar mais cara’.
Essa mudança de linguagem decorre de dois motivos principais. Em primeiro lugar, é o que já falamos, não dá para o jornal fazer muita reflexão, esse é o papel dos jornais mais caros. A linguagem do jornal é feita para ser ‘objetiva’, no sentido de que a pessoa lê e acabou. Não há um questionamento sobre que há por trás desse aumento nas taxas, sobre as consequências no futuro e etc. A cervejinha vai ficar mais cara e ponto final.
Além disso, esse tipo de jornal é vendido na banca, não há Assinatura Mensal ou coisa do tipo, porque o público tem uma renda inconstante e é difícil a distribuição em bairros mais distantes. Essa característica é importantíssima, porque se o jornal não for chamativo e afetar diretamente a vida do leitor não vai conseguir ser vendido. Sorteio de Casas, brindes, a tiragem é extremamente suscetível a essas promoções. Quanto aos principais assuntos, tem que ter comentários sobre o jogo de futebol do dia anterior, quem é quem na próxima novela da Globo; tudo isso chama a atenção do público, mas até que ponto esse interesse do público prevalece sobre o interesse público?
Márcia Amaral, em seu livro, chega a seguinte conclusão sobre os jornais populares: “Um fato será notícia na imprensa popular se possuir a capacidade de entretenimento, for próximo grográfica ou culturalmente do leitor, puder ser simplificado, puder ser narrado dramaticamente, tiver identificação dos personagens com os leitores ou se for útil”.
Concluímos, então, que além do preço, o público também escolhe esses jornais pela praticidade e pela linguagem direcionada. Não há necessariamente um ‘empobrecimento’ do conteúdo, ou seja, há espaço para iniciativas de qualidade nesse meio – o que não significa a inexistência de casos negativos. Só o fato de haver um jornal destinado ao leitor de menor renda, apesar de não ser um tipo de Jornalismo Contra-Hegemônico, já é, até certo ponto, um avanço.
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