De Gabriel Shinohara
O internet.org é um projeto sem fins lucrativos do
Facebook em conjunto com outras empresas de tecnologia, que procura prover
acesso à internet aos dois terços da população mundial que estão desconectadas,
principalmente em países da África, Ásia e América Latina.
O método de inclusão digital envolve parcerias com
provedores locais que oferecem seus serviços de forma gratuita, contando com a
possibilidade de os usuários buscarem uma assinatura paga em um futuro próximo.
Apesar de aparentemente altruísta e inclusivo, a
iniciativa levantou discussões e críticas quanto a seus reais objetivos, já que
a pequena capacidade de internet dos provedores apenas garante acesso a sites
pré-selecionados, como a Wikipédia, sites de notícia, serviços de saúde e ao
Facebook.
Ativistas indianos (país em que o programa já está em
funcionamento) quando perguntados pela Organização de Regulação de
Telecomunicações local, sobre a questão da neutralidade da rede, se mostraram
preocupados. Em um artigo publicado no site hidustantimes.com, o grupo chamado
“savetheinternet.in coalition” afirmou que “a internet não é o Facebook” defendendo
o direito dos usuários à um espaço livre na rede.
Mesmo defendendo veemente o programa em artigo
no mesmo Hisdustan Times, aonde afirmava que a “neutralidade da rede não entra em
conflito com o trabalho de conseguir que mais pessoas se conectem”, um dos
maiores conglomerados de mídia indiano, a Times Group, se retirou do projeto
junto com algumas outras grandes empresas locais.
Um detalhe que não deve ser esquecido: serviços
gratuitos de internet normalmente lucram com a venda de espaços publicitários
ou com propagandas direcionadas. Para o Facebook, quanto mais usuários, mais
dados disponíveis e mais lucro.
Brasil
Em encontro com a presidente Dilma Rousseff na última
Cúpula das Américas, no Panamá, Mark Zuckerberg anunciou uma parceria com o
governo brasileiro, que pretende levar o projeto internet.org para as regiões
que não possuem acesso à rede.
— Estamos aqui para anunciar uma parceria entre o
Facebook e o governo brasileiro, no sentido de assegurar que as tecnologias que
garantem acesso à internet e aos serviços de internet, educação, saúde, e todos
os produtos que a internet pode tornar disponíveis na rede possam ser acessados
do Brasil — disse Dilma.
Mesmo após a suada
aprovação do Marco Civil da Internet, que garante a neutralidade da rede, a
proteção aos dados pessoais e a privacidade, a iniciativa conseguiu apoio
governamental. Não é uma decisão fácil, pois o projeto coloca em conflito dois
artigos da lei Nº12.965 (do Marco Civil). O artigo 3º que lista os princípios
do uso da internet no Brasil, ilustrado abaixo:
Art. 3o A disciplina do uso da internet no
Brasil tem os seguintes princípios:
I - garantia da
liberdade de expressão, comunicação e manifestação de pensamento, nos termos da
Constituição Federal;
V - preservação da
estabilidade, segurança e funcionalidade da rede, por meio de medidas técnicas
compatíveis com os padrões internacionais e pelo estímulo ao uso de boas
práticas;
VIII - liberdade
dos modelos de negócios promovidos na internet, desde que não conflitem com os
demais princípios estabelecidos nesta Lei.
E o artigo
4º, que diz que a internet no Brasil tem como objetivo a promoção do direito de
acesso à internet a todos.
Art. 4o A disciplina do uso da internet no
Brasil tem por objetivo a promoção:
II - do acesso à informação, ao conhecimento e à
participação na vida cultural e na condução dos assuntos públicos;
IV - da adesão a
padrões tecnológicos abertos que permitam a comunicação, a acessibilidade e a
interoperabilidade entre aplicações e bases de dados.
Esses dois artigos são exemplos práticos
do discurso de Mark Zuckerberg e dos ativistas indianos. Enquanto o primeiro
defende o acesso universal, mesmo sem os princípios de neutralidade, dizendo:
“é melhor ter algum acesso à internet do que nenhum”, o outro afirma que a
neutralidade da rede é imprescindível e considera básico o direito à
experiência de uma internet livre para os indianos, assim como o CEO do
Facebook teve.
Sem dúvida a implantação desse projeto
violaria o Marco Civil da Internet, mesmo o reforçando simultaneamente. Grupos
como o Proteste e o coletivo Intervozes já manifestaram suas opiniões
contrárias ao projeto, afirmando que a neutralidade da rede e a proteção aos
dados pessoais entrariam em risco com a sua implantação.
O Comitê Gestor de Internet no Brasil (órgão
que propõe normas e procedimentos relativos a internet) já questionou o projeto
quanto a suas intenções e espera o anúncio oficial, em Junho, para manifestar
sua opinião.
0 interações:
Postar um comentário